sexta-feira, 20 de abril de 2007

O belo, a arte, o metro, sufocar a poesia

Vivemos com tanta pressa, com tanta sofreguidão para evitar todos os perigos - alguns imaginários - que nem reparamos naquilo que é belo, que pode estar ao alcance de uma mera paragem para fruição. Ignoramos a simplicidade e somos, sobretudo, desconfiados. O que é arte? É, para mim, o que foge ao normal curso do que nos é dado. É algo incontrolável, como a vida, e belo e violento como o amor. Um quadro de Picasso num restaurante é arte? E um urinol nas paredes de uma galeria conceituada é arte? E um violinista famoso a interpretar obras de grandes músicos com um violino raro numa estação de metro é arte? Foi isso que o Washington Post tentou perceber:

«Numa experiência inédita, Joshua Bell, um dos mais famosos violinistas
do Mundo, tocou incógnito durante 45 minutos, numa estação de metro de
Washington, de manhã, em hora de ponta, despertando pouca ou nenhuma
atenção. A provocatória iniciativa foi da responsabilidade do jornal
"Washington Post", que pretendeu lançar um debate sobre arte, beleza e
contextos. Ninguém reparou também que o violinista tocava com um
Stradivarius de 1713 - que vale 3,5 milhões de dólares.
Três dias antes, Bell tinha tocado no Symphony Hall de Boston, onde os
melhores lugares custam 100 dólares, mas na estação de metro foi
ostensivamente ignorado pela maioria.
A excepção foram as crianças, que, inevitavelmente, e perante a oposição
do pai ou da mãe, queriam parar para escutar Bell, algo que, diz o
jornal, indicará que todos nascemos com poesia e esta é depois,
lentamente, sufocada dentro de todos nós

2 comentários:

Tata disse...

"Todos nascemos com poesia e esta é, lentamente, sufocada dentro de todos nós."

É um pouco também como o mito do bom selvagem de Jean Jacques Rousseau... a vida, os afazeres diários, esta sociedade em que vivemos faz com que percamos a poesia e a bondade com que cada um de nós nasce.

Carlos M. Gomes disse...

Não posso concordar mais. É esta azáfama diária que nos vai tirando o ar que a poesia respira.
Ainda não sei é se concordo totalmente com o mito do bom selvagem porque parte da premissa que o homem é naturalmente bom. E isso é tema sob investigação...